domingo, 13 de março de 2005

Carta escrita no ano 2070


Ano 2070 acabo de completar os 50, mas a minha aparência é de alguém
de 85. Tenho sérios problemas renais porque bebo muito pouca água.
Creio que me resta pouco tempo. Hoje sou uma das pessoas mais idosas
nesta sociedade. Recordo quando tinha 5 anos. Tudo era muito
diferente. Havia muitas árvores nos parques, as casas tinham bonitos
jardins e eu podia desfrutar de um banho de chuveiro com cerca de
uma hora.


Agora usamos toalhas em azeite mineral para limpar a pele. Antes
todas as mulheres mostravam as suas formosas cabeleiras. Agora
devemos rapar a cabeça para a manter limpa sem água
. Antes o meu pai
lavava o carro com a água que saía de uma mangueira. Hoje os meninos
não acreditam que a agua se utilizava dessa forma. Recordo que havia
muitos anúncios que diziam CUIDA DA ÁGUA, só que ninguém lhes
ligava; pensávamos que a água jamais se podia terminar.


Agora, todos os rios, barragens, lagoas e mantos aquíferos estão
irreversivelmente contaminados ou esgotados. Antes a quantidade de
água indicada como ideal para beber era oito copos por dia por
pessoa adulta.
Hoje só posso beber meio copo. A roupa é descartável, o que aumenta
grandemente a quantidade de lixo; tivemos que voltar a usar os poços
sépticos (foças) como no século passado porque as redes de esgotos
não se usam por falta de água.


A aparência da população é horrorosa; corpos desfalecidos, enrugados
pela desidratação, cheios de chagas na pele pelos raios
ultravioletas que já não tem a capa de ozono que os filtrava na
atmosfera, imensos desertos constituem a paisagem que nos rodeia por
todos os lados
. As infecções gastrointestinais, enfermidades da pele
e das vias urinárias são as principais causas de morte.


A indústria está paralisada e o desemprego é dramático. As fábricas
dessalinizadoras são a principal fonte de emprego e pagam-te com
água potável em vez de salário
.


Os assaltos por um bidão de água são comuns nas ruas desertas. A
comida é 80% sintética. Pela ressequidade da pele uma jovem de 20
anos está como se tivesse 40. Os científicos investigam, mas não há
solução possível. Não se pode fabricar agua, o oxigénio também está
degradado por falta de árvores o que diminuiu o coeficiente
intelectual das novas gerações.


Alterou-se a morfologia dos espermatozóides de muitos indivíduos,
como consequência há muitos meninos com insuficiências, mutações e
deformações. O governo até nos cobra pelo ar que respiramos. 137 m3
por dia por habitante e adulto. A gente que não pode pagar é
retirada das "zonas ventiladas", que estão dotadas de gigantescos
pulmões mecânicos que funcional com energia solar, não são de boa
qualidade mas pode-se respirar, a idade média é de 35 anos.


Em alguns países ficam manchas de vegetação com o seu respectivo rio
que é fortemente vigiado pelo exército, a água voltou-se um tesouro
muito cobiçado mais do que o ouro ou os diamantes. Aqui em troca, no
há arvores porque quase nunca chove, e quando chega a registar-se
uma precipitação, é de chuva ácida; as estações do ano têm sido
severamente transformadas pelas provas atómicas e da indústria
contaminante do século XX. Advertiam-se que havia que cuidar o meio
ambiente e ninguém fez caso
. Quando a minha filha me pede que lhe
fale de quando era jovem descrevo o bonito que eram os bosques, lhe
falo da chuva, das flores, do agradável que era tomar banho e poder
pescar nos rios e barragens, beber toda a água que quisesse, o
saudável que era a gente. Ela pergunta-me:
Papá! Porque se acabou a agua? Então, sinto um nó na garganta; não
posso de sentir-me culpado, porque pertenço à geração que terminou
destruindo o meio ambiente ou simplesmente não tomámos em conta
tantos avisos.
Agora os nossos filhos pagam um preço alto e sinceramente creio que
a vida na terra já não será possível dentro de muito pouco porque a
destruição do meio ambiente chegou a um ponto irreversível.


Como gostaria voltar atrás e fazer com que toda a humanidade
compreendera isto quando ainda podíamos fazer algo para salvar ao
nosso planeta terra!


Documento extraído da revista biográfica "Crónicas de los Tiempos"
de Abril de 2002.